Tocando as bolas

Trocando as bolas

Não conseguia dormir. Virava de um lado para o outro, sem parar. Meu ombro esquerdo, responsável pelo braço que só me vale mesmo para sustentar o relógio, doía como cutícula roída e inflamada.

Os comprimidos de alprazolam, bromazepam e até mesmo de marzipam já não faziam mais efeito. Quando, de repente, não mais que de repente, lembrei-me de minha garrafinha inox, onde guardo umas boas duas ou três doses do meu scotch single malt.

Mas, lutando contra o maldito alemão, nesta altura do campeonato já sentado à beira do caminho… ops!… da cama, meus miolos fritavam à procura da resposta à pergunta que lhe fizera:

– “Onde eu tinha guardado aquele bendito remédio para minhas horas solitárias?”

Tudo escuro no quarto, cortina fechada, ventilador de teto ligado na velocidade média, friozinho gostoso para se dormir por conta do inverno baiano que se aproximava — e mesmo assim não conseguia dormir? Caramba! –, meus miolos fritavam cada vez mais:

– “Estaria a garrafinha na sala, no canto direito do bar, segunda prateleira de baixo para cima? Ou estaria na cozinha, armário do meio, ponta direita, primeira divisão, onde ficavam alguns remédios emergenciais?

Ah… sabia que podia confiar em minhas lembranças recentes. Como se fosse um estalar de dedos, a lembrança veio-me à fuça: a garrafinha estava no canto da pia do banheiro. Eu tinha deixado lá depois de encontrá-la no bolso de trás de uma bermuda que, após quatro ou cinco dias de uso, finalmente, decidi colocar no certo de roupas sujas.

Tateando, andando no corredor formado pela parede do quarto e minha cama, preocupado para não bater o mindinho numa daquelas miseráveis quinas, consegui envolver com minha ansiosa mão a maçaneta da porta do banheiro. Abri e entrei, sem acender as lâmpadas para que ninguém se sentisse incomodado. Tateando na negritude, melhor dizendo, e em nome do politicamente correto, na absoluta falta claridade, fui deslizando a mão até o canto direito da plataforma escura de mármore que suportava tudo aquilo que de útil e inútil consegue-se juntar num banheiro, encontrei a tão desejada garrafinha.

Ao, sofregamente, abrir sua tampa, confesso que estranhei um pouco o fato de ela ter saído completamente e ficado em minha trêmula e canhota mão, mas eu só queria saber daquele gole salvador, que me faria, finalmente, dormir.

A cusparada foi indescritível. A parte interna das bochechas pegando fogo, o meu grito de “puta que pariu”, os olhos fumegantes e o ajoelhar-se sobre o vaso sanitário para ver se botava mais alguma coisa para fora é o cenário mais simples que posso querer demonstrar para descrever o que senti.

Miserável! Desgraçado! Filho da puta! Eu tinha tentado virar para dentro da goela quase meio vidro da minha colônia Malbec! Maldito Boticário!

Abração carinhoso,

Braulino

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