Rock’n roll

Sabe, querido e inúltil Facebook, a discrição absoluta de nossos queridos vizinhos, duas famílias descendentes de libaneses ou sírios¹, ainda agora a pouco fiquei imaginando o que se passava pela cabeça deles quando o adolescente de 14 ou 15 anos da casa do meio, geralmente aos domingos pelo final da tarde — quando ficava só e mal intencionado em casa –, sentava-se ao piano da irmã, que pouco o usou, para bater inconsequente e fortemente nas teclas, pretendendo acompanhar o rock’n roll que alucinava no último volume da eletrola hifi novinha em folha, montada especialmente para meu pai por um técnico japonês cuja loja e oficina ficava lá no final da rua Oswaldo Cruz. O final da rua Carlos Gomes não era o mesmo naquelas oportunidades.

Coitado do piano e do que se passava por minha cabeça, que não entendia patavinas do que cantavam, mas o ritmo tornava-me incontrolável. Martelava as teclas sem saber exatamente quais sons delas saiam, martelava meus neurônios pretendendo entender aqueles acordes rápidos e tresloucados. Em dois ou três anos, passei por toda aquela geração de pais, tios e sobrinhos da música que revolucionava metade do mundo, com a outra metade torcendo o nariz. Música de negros, de desajustados, conhecidos também como “transviados” (desviado; aquele que se transviou; quem se afastou dos bons costumes, só para registrar sem confusão). Mas, como a coisa pegou, começaram a aparecer os brancos e a turma do WASP² entrou na roda. Até um almofadinha tentaram emplacar, na figura de Pat Boone. Lembra-se, querido e inútil Facebook. Ah… já ia me esquecendo: não foi do seu tempo.

Chuck Berry, Elvis Presley, Neil Sedaka, Paul Anka, Jerry Lee Lewis, Bill Haley & His Comets, Brenda Lee, Bobby Darin, Connie Francis, Chubby Checker e o rei, o maioral, o louco, o insano. Notou que não outorguei o título de rei a Elvis, não foi? Pois então, o título sempre pertenceu a Little Richard, negro, topetudo, desajusta, homossexual. Falo de rock, rock mesmo.

Feliz Dia das Mães.
(¹) – meu pai sempre contava um chiste sobre turcos, libaneses e sírios. Dizia que quando chegavam ao Brasil, imigrantes pobres, eram turcos. Às custas de muito suor, trabalho e habilidade em comerciar, logo melhoravam de vida e passavam a ser libaneses. Já ricos, tornavam-se sírios.

(²) – WASP – é o acrônimo que em inglês significa “Branco, Anglo-Saxão e Protestante” (White, Anglo-Saxon and Protestant).

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